Espacios. Vol. 36 (Nº 23) Año 2015. Pág. 5
Deyse Sene de Melo SOUZA 1; Monica Franchi CARNIELLO 2
Recibido: 05/08/15 • Aprobado: 24/09/2015
RESUMO: Este estudo aborda metodologias de diagnóstico para planejamento do desenvolvimento territorial, fundamentais para uma compreensão adequada da realidade de uma localidade ou região, expressa por indicadores e medições estatísticas. Tem-se como objetivo central analisar as pesquisas realizadas por duas instituições governamentais federais brasileiras a partir das premissas recomendadas por Stiglitz, Sen e Fitoussi para avaliação do desenvolvimento de um local, região ou país. Trata-se de uma pesquisa exploratória, de abordagem qualitativa. Realizou-se o confronto entre as recomendações para mensuração de variáveis que compõem o conceito de e, posteriormente uma sistematização dos indicadores desenvolvidos pelas instituições IBGE e IPEA, como CENSO e Sistema de Percepção Social. O estudo apontou que as instituições estudadas atendem parcialmente as recomendações dos autores, e que tal situação reflete a complexidade na articulação entre as dimensões que compõem o conceito de desenvolvimento, o que pode interferir na tomada de decisão para o planejamento de políticas públicas. |
ABSTRACT: This study, developed through research conducted at the federal governmental institutions IBGE and IPEA, has as its theme the diagnostic methodologies for development planning, since the assertive decision-making and public policy-making are based on a proper understanding of the reality of a city or region, expressed by indicators and statistical measurements. The main objective is to analyze the research carried out by Brazilian federal governmental institutions from the premises recommended by Stiglitz, Sen and Fitoussi to evaluate the development of a local, region or country. It was performed a systematization of indicators developed by IBGE and IPEA institutions, such as continuous PNAD, the Household Budget Survey, Census, System Social perception of Education. The study found that the institutions studied partially meet the recommendations of the authors, and this situation reflects the complexity of coordination between the dimensions that compose the concept of development, and such a situation may interfere with decision-making for public policies planning. |
Em 27 de março de 2014, uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) chamou a atenção de grande parte da população brasileira pelo resultado apresentado, referente aos tipos de roupas que as mulheres utilizam, pois, dependendo do traje incentivam-se abordagens por parte dos homens, justificando inclusive ações como o estupro.
O resultado apresentado indicava que 65,1% da população brasileira concordavam totalmente ou parcialmente com a afirmação "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas" (Leite, 2014, p.1). Tal afirmativa gerou manifestações da sociedade que se surpreendeu que o resultado. No dia 04 de abril de 2014 o IPEA divulgou uma nota explicativa sobre o equívoco na apresentação do resultado. Ao invés de 65,1%, o resultado correto seria 26%. Tal fato gerou o questionamento dos métodos de pesquisa e a ponderação nas respostas colhidas (Leite, 2014, p.1).
Outro fato representativo no que tange aos dados de pesquisa publicados foi o caso do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pela realização da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios (PNAD Contínua), que mede indicadores sociais e do mercado de trabalho.
A PNAD Contínua produz informações referentes à idade, gênero, e nível de instrução. Permite, ainda, estudos e pesquisas relacionados ao desenvolvimento socioeconômico do País, por meio dos dados de trabalho infantil e outros temas. Abrange o Brasil, grandes regiões, unidades de federação, e 20 regiões metropolitanas, municípios e capitais (IBGE 2014). A pesquisa é realizada por amostra de domicílios a partir de uma amostra mestra. Com a finalidade de garantir a representatividade dos resultados, a periodicidade é trimestral para indicadores de trabalho; anual para o trabalho infantil e outras formas de trabalho; e variável para outros temas. A divulgação de novas pesquisas realizadas pela Instituição foi interrompida em razão da solicitação de senadores que contestaram a metodologia utilizada. A Lei Complementar 143, de 17 de julho de 2013, alterou o indicador PIB per capita, para renda domiciliar per capita. Nesse contexto, os pesquisadores da Instituição entraram em greve e afirmaram ser um órgão de Estado e não um órgão de governo. Tal fato demonstra a representatividade dos dados para a compreensão de realidade, bem como a repercussão dos resultados no cenário político.
Os casos apresentados podem demonstrar a importância da metodologia utilizada em uma pesquisa, e demonstra a consequência de um resultado equivocado apresentado, pois decisões são tomadas e planejamentos são realizados mediante a apresentação de pesquisas e de indicadores. Esses dados são os subsídios para se pensar no futuro e também impactam na opinião.
O planejamento pode ser entendido como o estudo e análise de possíveis situações que podem vir a acontecer. É a diretriz para as tomadas de decisão. Em se tratando de planejamento do setor público, a elaboração de um plano é imprescindível para que os gestores possam atuar no presente.
Instituições de pesquisas federais, dentre as quais o IPEA e IBGE, geram pesquisas e indicadores que são usados como referência para tomadas de decisão tanto no setor público como no privado. No caso do setor público, os resultados das pesquisas afetam diretamente as decisões referentes às políticas públicas.
O objetivo feral do artigo foi analisar as pesquisas realizadas pelas instituições IPEA e IBGE, com foco no Sistema de Indicadores de Percepção Social (primeira, segunda e terceira edição) e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD contínua), Pesquisa de Orçamento Familiar, e CENSO a partir das premissas recomendadas por Stiglitz, Sen e Fitoussi (2010) para avaliação do desenvolvimento de um local, região ou país.
A multidimensionalidade do conceito de desenvolvimento, superando a sinonímia com o crescimento econômico, e associado à busca da qualidade de vida, questão amplamente explorada por Sen (2000); Dallabrida (2012); Brandão (2012); Furtado (1968).
Para a formulação de políticas públicas que fomentem o desenvolvimento de um território é preciso obter informações e dados que irão justificar a sua implementação, portanto a utilização de indicadores torna-se importante. Esta seção irá definir indicadores e a sua relação com a realidade que pretendem mostrar.
Para estudo e análise do desenvolvimento e sua caracterização são necessários indicadores relacionados à educação, saúde, renda, população e índice de desenvolvimento humano, e produto interno bruto, por exemplo.
Os indicadores são subsídios para tomadas de decisão e indicam a eficiência ou ineficiência de ações de políticas públicas. Comumente são citados em mídias, jornais, e debates políticos.
Não se contesta o fato de que os indicadores econômicos são importantes na medida em que representam dados e informações apontadores do comportamento individual e coletivo das variáveis e fenômenos componentes de um sistema econômico, quaisquer que sejam as dimensões territoriais pesquisadas (Pimenta, 2014, p.51).
Januzzi (2004) afirma que os indicadores deixaram de aparecer apenas em diagnósticos e relatórios governamentais para assumir um papel mais representativo nas discussões político-sociais da sociedade brasileira.
Um indicador social é uma medida em geral quantitativa dotada de significado social substantivo, usado para substituir, quantificar ou operacionalizar um conceito social abstrato, de interesse teórico (para pesquisa acadêmica) ou programático (para formulação de políticas). É um recurso metodológico, empiricamente referido, que informa algo sobre um aspecto da realidade social ou sobre mudanças que estão se processando na mesma (Januzzi, 2004, p.15).
Nos anos 1920 e 1930 registraram-se os primeiros marcos conceituais dos indicadores sociais, porém foi nos meados dos anos 1960 que adquiriram corpo científico, dadas as tentativas de organizar sistemas mais amplos de desenvolvimento de mudanças sociais e verificação do impacto das políticas sociais na sociedade desenvolvidas e subdesenvolvidas.
Nesse período evidencia-se o descompasso entre crescimento econômico e melhoria das condições sociais nos países de Terceiro Mundo. O crescimento econômico não era mais condição para garantir o desenvolvimento social (JANUZZI, 2004).
[...] statistical indicators are importante for designing and assessing policies aiming at advancing the progresso f society, as well as for assessing and influencing the functioning of economic markets. Their role has incrreased significantly over the last two decades. This reflects improvements in the level of modern economies and the widespread use od information technology. (Stiglitz; Sen; Fitoussi, 2010, p.1)
Conhecer e saber interpretar os limites e potencialidades dos indicadores sociais pode ser de grande valia para os agentes e instituições envolvidos, pois a partir deles será possível alocar os recursos necessários para os indicadores que se mostram mais carentes (Januzzi 2002; Diener e Suh, 1997).
Januzzi (2005, p.138) destaca que "no campo aplicado das políticas públicas, os indicadores sociais são medidas usadas para permitir a operacionalização de um conceito abstrato ou de uma demanda de interesse programático". Os indicadores são, portanto, subsídios para tomadas de decisão políticas, realizando o apontamento, a indicação, e aproximação do contexto real de uma determinada localidade e/ou região.
Do "Produto Interno Bruto", da "renda Per Capita", do "Índice de Desenvolvimento Humano", da "Felicidade Interna Bruta" aos mais arrojados indicadores, pensar o desenvolvimento, somente, por essas perspectivas implica em reforçar a lógica que o constitui e que o dá origem. Ganha em pertinência um conjunto de estudos que questionam essas frentes que sustentam as percepções do desenvolvimento associadas ao humano, à qualidade de vida, ao equilíbrio e à sustentabilidade do desenvolvimento (Pimenta, 2014, p.52).
As decisões podem tornar-se distorcidas a partir do momento das medições que são realizadas, pois pode haver uma grande diferença entre a medida padrão de crescimento econômico, inflação e desemprego, e a percepção da população (indivíduos).
Tal situação tem desestruturado a confiança dos cidadãos nas estatísticas oficiais, assim, na França e no Reino Unido apenas dois terços da população confiam nas estatísticas oficiais. Essas diferenças podem ser explicadas por diversos motivos (Stiglitz; Sen; Fitoussi, 2010). A crise de 2008 também colocou em xeque a credibilidade de dados e estatísticas econômicas e do mercado financeiro, conforme explicitado por Harvey (2011).
A escolha de determinado indicador poderá servir como elemento de apoio e entendimento de determinada realidade, mas poderá explicar muito pouco sobre a natureza, as causas, os efeitos e as consequências. Os indicadores explicam um aspecto da realidade (Pimenta, 2014).
Para a área acadêmica, o Indicador Social faz a ligação entre os modelos explicativos da Teoria Social e a evidência dos fenômenos sociais observados. Em uma perspectiva programática é um instrumento que monitora a realidade social, para que assim possam ser formuladas e reformuladas ações de políticas públicas (Januzzi, 2004).
Não se pode deixar de abordar a Agenda 21 como uma ferramenta para o desenvolvimento sustentável, que estabelece e aborda indicadores para a gestão ambiental e o desenvolvimento de forma sustentável.
A Organização das Nações Unidas (ONU) realizou a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), mais conhecida como Rio 92, que ocorreu na cidade do Rio de Janeiro em 1992, quando 179 países participantes assinaram a Agenda 21 Global.
A Agenda 21 é um documento com 40 capítulos, que tem a finalidade de promover, em escala planetária, um novo padrão de desenvolvimento, mais conhecido como desenvolvimento sustentável, um novo modelo proposto para o século 21 (Ministério do Meio Ambiente, 2014).
Da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), ocorrida em 1992, no Rio de Janeiro, foram produzidos importantes documentos, destacando a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Declaração de Princípios sobre o Uso das Florestas, a Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica e a Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, e a Agenda 21 Global (Malheiros; Phlippi Jr; Coutinho, 2008, p.8).
A Agenda 21 estabeleceu, de certa forma, um comprometimento entre governantes do mundo no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável. Com o estabelecimento da Agenda 21 Global deu-se início à Agenda 21 Nacional, e consequentemente à local e à regional.
É importante destacar que a Agenda 21 brasileira explicita as grandes questões a serem enfrentadas e pactuadas entre governo e sociedade para atingir a sustentabilidade ambiental, econômica, social e institucional, apresentando diagnósticos e proposições. A ausência da proposição nesse documento de indicadores que compõem um sistema de monitoramento e avaliação merece destaque para reflexão (Malheiros; Phlippi Jr; Coutinho 2008, p.8).
As diretrizes constantes na documentação da Agenda 21 são: combate à pobreza; mudança nos padrões de consumo; dinâmica demográfica e sustentabilidade; proteção e promoção das condições da saúde humana; promoção do desenvolvimento sustentável dos assentamentos humanos; interação entre meio ambiente e desenvolvimento nas tomadas de decisão; proteção da atmosfera; abordagem integrada do planejamento e do gerenciamento dos recursos terrestres; manejo e gerenciamento de ecossistemas frágeis; promoção do desenvolvimento rural e agrícola sustentável; conservação da diversidade biológica; proteção dos oceanos e todos os tipos de mares; proteção da qualidade e do abastecimento dos recursos hídricos; manejo ecologicamente saudável das substâncias químicas tóxicas; manejo ambientalmente saudável dos resíduos perigosos; manejo saudável de produtos radiativos; ação mundial da mulher, com vistas a um desenvolvimento equitativo; a infância e a juventude do desenvolvimento sustentável; reconhecimento e fortalecimento da população indígena; fortalecimento das organizações não governamentais; fortalecimento do papel dos trabalhadores e de seus sindicatos, do comércio e indústria e dos agricultores; transferência de tecnologia ambientalmente saudável, cooperação e fortalecimento institucional; a ciência para o desenvolvimento sustentável; promoção do ensino, da conscientização e do treinamento (Ministério do Meio Ambiente, p. 2014).
Não existe um único indicador que possa mensurar uma sociedade, dada a sua pluralidade que a torna tão complexa. Tentar captar o que está acontecendo por meio de um conjunto de números pode ser grosseiramente enganador.
A preocupação com o futuro deve ser algo a se pensar no presente, sabendo que, infelizmente, o nível de bem-estar não é sustentável. Há um bom tempo existe uma inquietação em utilizar o PIB como uma medida do bem-estar social, e tem ficado claro que se trata de uma métrica insuficiente para medir o bem-estar ao longo do tempo, especialmente nas dimensões econômicas, ambientais e sociais, e em alguns aspectos que são referidos com a sustentabilidade (Stiglitz; Sen; Fitoussi, 2010).
Além de garantir a relação entre conceito e os indicadores propostos é preciso certificação da confiabilidade para as cifras calculadas. Os indicadores podem ser calculados erroneamente: erros advindos do processo da coleta de dados usada na sua construção, além de erros amostrais (Januzzi, 2002, p.).
Para Kayano; Caldas (2002, p.2), "os indicadores, portanto, permitem acompanhar, por exemplo, as mudanças da qualidade de vida de determinado município num período de dez anos; mas também permitem comparar num mesmo período municípios com perfis semelhantes" (Kayano; Caldas, 2002, p. 2).
Diante da importância dos indicadores para o monitoramento das mudanças sociodemográficas, podendo-se assim demonstrar a qualidade de vida de determinada população, as diferenças regionais e locais (diferentes índices), aspectos ambientais e de sustentabilidade, os autores Stiglitz, Sen e Fitoussi (2010) propõem 12 recomendações para um desenvolvimento sustentável, listadas e descritas no Quadro 1, a seguir, que indica a recomendação e posteriormente traz o detalhamento de cada recomendação proposta pelos autores com uma breve descrição.
Essas recomendações estão diretamente relacionadas às dimensões de qualidade de vida, abordando-as em diferentes aspectos: 1ª avaliação de bem-estar: considerar consumo e renda, e não somente produção; 2ª perspectiva da família; 3ª consumo em conjunto com a riqueza; 4ª distribuição de renda, consumo e riqueza; 5ª ampliar medidas de rendas para atividades não mercantis; 6ª qualidade de vida; 7ª qualidade de vida (avaliar desigualdades); 8ª pesquisas devem ser projetadas para avaliar as relações entre os vários domínios de qualidade de vida de cada pessoa, e essa informação deve ser utilizada na elaboração de políticas em várias áreas; 9ª serviços de estatística: devem fornecer as informações necessárias para agregá-las às dimensões de qualidade de vida, permitindo a construção de diferentes índices; 10ª medidas tanto de bem-estar objetivo e subjetivo como fonte de informação sobre a qualidade de vida das pessoas; 11ª avaliação de sustentabilidade: requer um painel bem identificado de indicadores; e 12ª os aspectos ambientais da sustentabilidade merecem acompanhamento separado com base em um conjunto bem escolhido.
Os indicadores são instrumentos importantes para medição da eficiência e eficácia não apenas por parte da administração privada, como também por parte da administração pública. Sua utilização permite o comparativo entre localidades (espaços territoriais) e em períodos diferentes no mesmo município. Na administração pública, principalmente, os indicadores podem demonstrar maior transparência à gestão vigente. Com a adoção de técnicas para ponderação dos valores pode-se criar índices que sintetizem um conjunto de aspectos da realidade e representem conceitos mais abstratos e complexos, como, por exemplo, qualidade de vida, grau de desenvolvimento humano, e nível de desempenho de uma gestão (Kayano; Caldas, 2002).
Quadro 1 - Recomendações de indicadores
Recomendações |
Descrição |
1 – Avaliação de bem-estar, considerar consumo e renda, e não somente produção |
Não considerar apenas o PIB para avaliar o bem- estar de um indivíduo. |
2 – Perspectiva da família |
Analisar os benefícios sociais e serviços fornecidos pelo governo, como cuidados a saúde e serviços educacionais. |
3 – Consumo em conjunto com a riqueza |
Considerar o patrimônio familiar. |
4 – Distribuição de renda, consumo e riqueza. |
É preciso considerar a distribuição de renda, consumo e riqueza entre as famílias. |
5 – Ampliar medidas de rendas para atividades não mercantis. |
Considerar os serviços que as famílias realizam para si mesmas. |
6 – Qualidade de vida |
Considerar saúde, educação, trabalho, habitação, participação política, segurança pessoal e econômica. |
7 - Qualidade de vida (avaliar desigualdades) |
Avaliar por meio de pessoas, grupos econômicos, de gênero e gerações. |
8 - Pesquisas devem ser projetadas para avaliar as relações entre os vários domínios de qualidade de vida de cada pessoa, e essa informação deve ser utilizada na elaboração de políticas em várias áreas
|
Quanto à concepção de políticas em áreas específicas, impactos sobre indicadores relativos a diferentes dimensões de qualidade de vida devem ser considerados em conjunto, para abordar as interações entre as dimensões e as necessidades das pessoas que estão em desvantagem em vários domínios. |
9 - Serviços de estatística devem fornecer as informações necessárias para agregar, por meio das dimensões de qualidade de vida, permitindo a construção de diferentes índices
|
Avaliar a qualidade de vida requer uma pluralidade de indicadores. Há fortes demandas para o desenvolvimento de uma única medida sumária. Várias medidas sumárias de qualidade de vida são possíveis, dependendo da questão abordada e da abordagem adotada. |
10 - Medidas tanto de bem-estar objetivo e subjetivos como fonte de informação sobre a qualidade de vida das pessoas. Serviços de estatística devem incorporar perguntas para capturar avaliações das vidas das pessoas, experiências hedônicas e prioridades na sua própria pesquisa. |
Felicidade, satisfação, emoção positiva e negativa deve medir-se separadamente |
11 – Avaliação de sustentabilidade requer um painel bem identificado de indicadores. |
A avaliação de sustentabilidade é complementar à questão atual de bem-estar ou desempenho econômico, e deve ser analisada separadamente. |
12 – Os aspectos ambientais da sustentabilidade merecem acompanhamento separado com base em um conjunto bem escolhido de indicadores físico. |
Há necessidade de um indicador que revele o aumento das concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa. As alterações climáticas também devem ser analisadas. |
Fonte: elaborado pelos autores. Adaptado de Stiglitz; Sen; Fitoussi (2010)
Januzzi (2004) enfatiza que há uma distinção entre indicadores sociais e estatísticas públicas, levantadas em censos demográficos, pesquisas amostrais ou coletadas em registros administrativos de Ministérios, Secretarias de Estado e Prefeituras. Destaca, ainda, que a pesquisa estatística é um dado social em forma bruta, porém é útil para a formulação de um indicador social, constituindo-se matéria- prima para a sua construção.
É preciso estabelecer os objetivos programáticos, delinear dimensões, os componentes e as ações operacionais vinculadas. A partir de então buscam-se dados e informações em fontes de cadastros públicos, em instituições que desenvolvem pesquisa para entendimento do desenvolvimento, como, por exemplo, o IBGE. Esses dados, reorganizados em índices, taxas, e valores absolutos, transformam-se em indicadores sociais (Januzzi, 2005).
É clara a importância da análise e uso correto dos indicadores, pois se não realizados dessa forma não se tem uma visão correta da realidade que se pretende estudar, nem a formulação de políticas públicas necessárias.
Januzzi e Guimarães (2005) destacam a importância de órgãos como o IBGE, Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Inep, e Datasus, institutos estaduais de pesquisa, com uma contribuição na disseminação dos dados e informações por internet, microdados, e outros meios e suportes.
Trata-se de pesquisa exploratória, que pode mostrar abordagens possíveis e diagnósticos para planejamento e desenvolvimento local e regional, propiciando maiores informações sobre o assunto. A abordagem é qualitativa e como técnica de coleta de dados foram utilizadas as fontes bibliográficas e documentais. Realizou-se o levantamento e análise de pesquisas desenvolvidas pelas instituições governamentais federais IBGE e IPEA.
A escolha dessas instituições governamentais justifica-se pelo fato de desenvolverem pesquisas e indicadores que podem retratar as características socioeconômicas do País. Por serem órgãos de Estado, são usados como referência pelas instâncias governamentais para tomadas de decisão de gestão e planejamento públicos, bem como pelo setor privado para decisões de gestão e marketing.
A escolha pela instituição IBGE justifica-se por ser responsável pela coleta primária dos dados, e com suas pesquisas conseguir abranger diversas regiões do Brasil, com a possibilidade de explorar questões socioeconômicas que poderão gerar indicadores para formulação de políticas públicas.
Determinou-se a escolha do IPEA pelo fato de a instituição estar ligada ao planejamento estratégico do governo brasileiro, tendo como foco a análise de dados para a formulação de políticas públicas.
O IPEA aborda temas diretamente ligados ao desenvolvimento econômico do País, lembrando que desenvolvimento econômico abrange não apenas o crescimento, e que tem como finalidade última a melhoria da qualidade de vida da população.
As pesquisas selecionadas como objeto de análise foram confrontadas com as recomendações propostas por Stiglitz; Sen; Fitoussi (2010) para avaliação de desenvolvimento.
O primeiro objeto de estudo foi o Censo Demográfico, gerado pelo IBGE. O Censo Demográfico tem por objetivo contar os habitantes do território nacional, identificar suas características e revelar como vivem. Esses detalhes são de grande importância para o governo e para a sociedade. Os censos vêm sendo realizados desde 1872 (IBGE, 2013).
"O censo demográfico é a mais complexa operação estatística realizada por um país, quando são investigadas as características de toda a população e dos domicílios do território nacional" (IBGE, 2010, p.11).
O quadro 2 apresenta a sistematização entre o indicador Censo Demográfico e as recomendações propostas por Stiglitz, Sen e Fitoussi (2010), já apresentado no quadro 1.
Quadro 2- Análise das recomendações propostas por Stiglitz, Sen e Fitoussi x Censo Demográfico
Recomendações |
Censo Demográfico |
1 – Avaliação de bem-estar, considerar consumo e renda, e não somente produção |
O Censo Demográfico avalia várias dimensões do bem-estar do indivíduo, como educação, rendimento, consumo e saúde, dimensões essenciais para a melhoria do bem-estar do indivíduo.
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2 – Perspectiva da família |
São coletadas informações referentes à escolaridade e saúde. Também se considera a estrutura familiar, quantidade de pessoas na família, número de filhos, quem é considerado o chefe da família. |
3 – Consumo em conjunto com a riqueza |
A pesquisa considera as características dos bens pessoais dos indivíduos, bem como a renda dos habitantes da residência pesquisada. |
4 – Distribuição de renda, consumo e riqueza. |
A pesquisa do Censo avalia diversas regiões e municípios do Brasil, podendo assim verificar a distribuição de renda. Considera ainda as características dos bens adquiridos pelos respondentes. |
5 – Ampliar medidas de rendas para atividades não mercantis |
A pesquisa aborda questões referentes às atividades não mercantis, tais como o trabalhador por conta própria, considerando a pessoa que trabalhou pelo menos uma hora completa, na semana de referência da pesquisa, na produção de bens, em atividade de pesca, agricultura, pecuária ou produção florestal destinada a consumo próprio. |
6 – Qualidade de vida |
A pesquisa considera a escolaridade, saúde, consumo, trabalho e rendimento. Essas dimensões são avaliadas no que diz respeito à qualidade de vida. |
7 - Qualidade de vida (avaliar desigualdades) |
Pelo fato de a pesquisa ser realizada em todo território brasileiro e utilizar outras variáveis como idade, escolaridade, grau de instrução, renda e trabalho é possível a avaliação de desigualdades entre gêneros, gerações e regiões do país. |
8 - Pesquisas devem ser projetadas para avaliar as relações entre os vários domínios de qualidade de vida de cada pessoa, e essa informação deve ser utilizada na elaboração de políticas em várias áreas. |
Com os índices resultantes da pesquisa do Censo Demográfico é possível a implementação de políticas em várias áreas, como educação e assistência à saúde. |
9 - Serviços de estatística devem fornecer as informações necessárias para agregar pelas dimensões de qualidade de vida, permitindo a construção de diferentes índices. |
A coleta de dados para a pesquisa do Censo Demográfico acontece em toda extensão territorial brasileira e com as variáveis investigativas utilizadas, é possível a construção de diferentes índices. |
10 - Medidas tanto de bem-estar objetivo e subjetivos como fonte de informação da qualidade de vida das pessoas. Serviços de estatística devem incorporar perguntas para capturar avaliações das vidas das pessoas, experiências hedônicas e prioridades na sua própria pesquisa. |
A pesquisa não aborda questões sobre as experiências hedônicas das pessoas. |
11 – Avaliação de sustentabilidade requer um painel bem identificado de indicadores. |
A pesquisa não avalia questões de sustentabilidade, porém por ser uma pesquisa de série histórica, realizada de 10 em 10 anos, os dados permitem uma análise de tendências da população brasileira. |
12 – Os aspectos ambientais da sustentabilidade merecem acompanhamento separado com base em um conjunto bem escolhido de indicadores físico. |
A pesquisa não contempla questões de aspectos ambientais. |
Fonte: elaborado pela autora (2015)
A pesquisa realizada pelo IBGE, o Censo Demográfico, avalia várias dimensões do bem-estar do indivíduo, mas não considera as dimensões relações pessoais, insegurança econômica, e governança política, que são de muita importância para análise e estudo sobre desenvolvimento.
Como afirmam Stiglitz, Sen e Fitoussi (2010), as emoções, opiniões e aspirações dos indivíduos devem ser coletadas no momento dos acontecimentos, pois o tempo tende a apagar da memória essas experiências.
Apesar de ser uma pesquisa com abundância de informações pelas variáveis utilizadas nas questões, as dimensões não utilizadas poderiam ter dado uma dimensão das características sociodemográficas do Brasil ainda melhor, podendo até mesmo analisar com maior rigor as políticas públicas a serem implementadas pelos governos.
Há um detalhamento da pesquisa em relação ao domicílio dos respondentes, relacionado às características físicas das residências, como o tipo de material utilizado no acabamento, se a parede é de alvenaria em seu acabamento, e até mesmo se o respondente possui casa própria, enfim, detalha-se também por regiões e municípios, dando a dimensão do poder aquisitivo dos indivíduos e das condições de sua moradia.
As informações obtidas por meio desses indicadores podem ser utilizadas para formulação de políticas públicas para incentivo à compra da casa própria, como outros programas de incentivo à moradia. Um exemplo é o programa Minha Casa Minha Vida, implantado para incentivar a compra de moradia com subsídios de acordo com a renda do indivíduo. Até mesmo instituições financeiras, públicas ou privadas valem-se dessas informações para formulação de planos especiais para compra de materiais de construção, entre outros.
O segundo objeto de análise foi o Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS), elaborado pelo IPEA. O SIPS está em sua terceira edição, e cada uma delas abordou uma questão em relação às famílias e às políticas públicas implementadas pelo Estado.
O SIPS se define como um sistema de indicadores sociais que se mostram úteis para verificar como a população avalia os serviços de utilidade pública e o grau de importância deles para a sociedade. Desta forma, subsidia o Estado na formulação, acompanhamento e avaliação de suas políticas públicas (IPEA, s/a, p.1).
Em sua primeira edição, do biênio 2010/2011, investigou temas relacionados à justiça, segurança pública, educação, trabalho e renda, direitos do trabalhador e qualificação profissional, saúde, mobilidade urbana, bancos (exclusão de serviços), igualdade de gênero e cultura. Nessa edição a pesquisa foi realizada em 2770 domicílios e em 146 municípios. Todas as unidades da Federação foram abrangidas, e foi utilizada a amostragem por cotas (IPEA, 2013).
A segunda edição, de 2011/2012, abordou temas de segurança pública, tempo livre e trabalho, percepção dos trabalhadores em relação à intensidade e às exigências no ambiente de trabalho, mobilidade urbana, assistência social, percepção sobre pobreza (causas e soluções), e defesa nacional. Nessa edição 3775 domicílios foram pesquisados em 212 municípios, abrangendo todas as unidades da Federação, utilizando a amostragem probabilística (IPEA, 2012).
Na terceira edição, de 2013/2014, os temas abordados foram tolerância social, violência contra as mulheres e serviços de telecomunicação (IPEA, 2014).
A primeira edição do SIPS abordou vários temas, entre eles a educação. Esse tema da pesquisa teve como objetivo captar a percepção atual da população em relação à educação pública e às ações públicas, que são consideradas importantes para a educação de qualidade.
Os Conselhos Escolares, o Programa do Livro Didático e o Programa da Merenda Escolar foram considerados importantes para a permanência do aluno na escola, assim como a qualificação do aprendizado e o apoio da gestão escolar. Em relação ao ensino superior, foi avaliada a opinião da população quanto ao Programa Universidade para Todos, o ProUni (IPEA, 2011).
A construção de indicadores de percepção da população sobre as políticas e serviços públicos é uma forma útil aos gestores governamentais na busca pelo aprimoramento das ações do Estado, especialmente na fase de monitoramento de políticas em implementação, a fim de proporcionar maior eficácia e eficiência aos investimentos públicos (IPEA,2011, p.3).
Quanto ao tema educação, foi aplicado um questionário com 21 questões objetivas a 2.773 pessoas em suas residências, no período de 3 a 19 de novembro de 2010. A amostra foi definida por cotas, tendo como parâmetro a Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD) de 2008, da Instituição IBGE (IPEA 2011).
Todos os entrevistados responderam perguntas relacionadas à qualidade da educação pública no Brasil, estando estudando ou não, ou serem responsáveis por alunos. As questões referentes aos programas Livro Didático, Merenda Escolar, e Conselhos de Escola foram direcionadas a pessoas que tinham conhecimento a respeito.
No programa ProUni também houve limitação para respostas. Para que isso ocorresse era necessário ser bolsista do programa, parente ou conhecido de quem era bolsista, ou conhecer o programa por outro meio (IPEA, 2011).
O quadro 3 apresenta o SIPS, com o tema educação com a sistematização das recomendações propostas por Stiglitz, Sen e Fitoussi.
Quadro 3 - Análise das recomendações propostas por Stiglitz, Sen e Fitoussi x SIPS Educação
Recomendações |
SIPS Educação |
1 – Avaliação de bem-estar, considerar consumo e renda, e não somente produção. |
A pesquisa avalia o bem-estar no quesito educação, não avaliando o bem-estar de maneira multidimensional, como proposto por Stiglitz, Sen e Fitousãosi (2010). Não considera, também, consumo e renda. |
2 – Perspectiva da família |
A pesquisa considera serviços fornecidos pelo governo, nesse caso especificamente a educação, e também questões referentes à merenda escolar e ao livro didático. |
3 – Consumo em conjunto com a riqueza |
A pesquisa não considera questões relacionadas ao consumo em conjunto com a riqueza. |
4 – Distribuição de renda, consumo e riqueza. |
O SIPS educação não avalia distribuição de renda, consumo e riqueza. |
5 – Ampliar medidas de rendas para atividades não mercantis. |
Dado o objetivo da pesquisa, não se abordam questões referentes às atividades não mercantis. |
6 – Qualidade de vida |
A pesquisa avalia a percepção do indivíduo sobre a educação no Brasil, que se relaciona à qualidade de vida, porém não considera a saúde e segurança, entre outros itens que se referem à qualidade de vida. |
7 - Qualidade de vida (avaliar desigualdades) |
Apesar de considerar apenas o assunto educação, com a pesquisa é possível avaliar desigualdades entres regiões e características demográficas. |
8 - Pesquisas devem ser projetadas para avaliar as relações entre os vários domínios de qualidade de vida de cada pessoa, e essa informação deve ser utilizada na elaboração de políticas em várias áreas. |
Os índices gerados pela pesquisa, referentes à percepção da educação, podem ser utilizados para a elaboração de políticas públicas, para melhorias, e implementação de programas educacionais. |
9 - Serviços de estatística devem fornecer as informações necessárias para agregar pelas dimensões de qualidade de vida, permitindo a construção de diferentes índices. |
Com o levantamento de dados da pesquisa é possível a construção de diferentes índices, com a percepção dos indivíduos relativa à educação. |
10 - Medidas tanto de bem-estar objetivo e subjetivo como fonte de informação sobre a qualidade de vida das pessoas. Serviços de estatística devem incorporar perguntas para capturar avaliação das vidas das pessoas, experiências hedônicas e prioridades na sua própria pesquisa. |
A pesquisa avalia a percepção do indivíduo em relação aos serviços de educação, expressando sua opinião e satisfação sobre esses serviços. |
11 – Avaliação de sustentabilidade requer um painel bem identificado de indicadores. |
A pesquisa não avalia questões de sustentabilidade. |
12 – Os aspectos ambientais da sustentabilidade merecem acompanhamento separado com base em um conjunto bem escolhido de indicadores físicos. |
A pesquisa não avalia questões sobre aspectos ambientais de sustentabilidade. |
Fonte: elaborado pelos autores (2015)
Dado o objetivo da pesquisa, de avaliar a percepção dos indivíduos em relação à qualidade dos serviços prestados pelo governo na área de educação, envolvendo a distribuição de merenda, livros didáticos, programas de incentivos do governo à educação, como o ProUni e Conselhos de Escola, os assuntos relacionados à insegurança econômica, governança política, saúde e relações sociais não foram considerados, deixando, assim, de ser uma avaliação multidimensional recomendada por Stiglitz, Sen e Fitoussi (2010).
A educação é um componente de extrema importância para o desenvolvimento, como já mencionado por Sen (2010), porém no Brasil os serviços prestados nessa área pelos governos muitas vezes não asseguram ao indivíduo uma educação de qualidade, privando-o de uma boa formação acadêmica, o que poderá impactar futuramente na sua ocupação laboral.
A pesquisa do Sistema de Indicadores de Percepção Social da educação avalia questões da educação básica, deixando de considerar a percepção do indivíduo em relação à formação acadêmica em níveis mais elevados, como a pós-graduação latu sensu e stricto sensu.
O Brasil apresenta uma deficiência no incentivo à formação de mestres e doutores.Com uma formação maior de doutores o País poderia avançar em inovação tecnológica, e a área da saúde poderia ser uma das maiores beneficiárias.
A pesquisa, nesse contexto, incorpora questões referentes ao Programa Universidade para Todos (ProUni), questionando a quantidade de vagas disponibilizadas pelo governo aos estudantes. A partir dessa pesquisa o governo brasileiro poderia verificar se as vagas ofertadas são suficientes em relação à demanda.
Políticas públicas podem e devem ser melhoradas. Muitos estudantes brasileiros pretendem e querem cursar o nível superior, o que se torna inviável em uma universidade ou faculdade particular, já que o preço da mensalidade é incompatível com a realidade de muitos que recebem apenas um salário mínimo.
O acesso ao nível superior estadual ou federal não é impossível, porém a maioria das vagas é ocupada por pessoas que tiveram uma educação básica de qualidade e puderam pagar por ela.
O governo brasileiro implementou um sistema de pontuação acrescido para estudantes que fizeram em sua totalidade o ensino básico em instituições públicas, mas essa solução é questionável. Deveria existir investimentos na educação básica pública, com melhoria salarial e capacitação dos professores.
Pode-se citar o programa Via Rápida, implementado pelo governo do estado de São Paulo com o objetivo de selecionar e capacitar pessoas que estejam fora do mercado de trabalho. Essa capacitação consiste na profissionalização, dada em um curso rápido, que retoma conceitos do ensino fundamental. O estudante recebe uma bolsa-auxílio desde que frequente as aulas.
O Programa apresenta dois vieses em relação ao seu objetivo, que é envolver aquele indivíduo sem ocupação, que precisa ser qualificado, no mercado de trabalho, recebendo auxílio financeiro para estudar. Houve uma falha estrutural no ensino, pois se tivesse recebido a educação adequada o indivíduo provavelmente já teria alcançado um trabalho condizente com sua formação.
O outro viés é que vários indivíduos pretendem permanecer nessa situação por um bom período de tempo, realizando o curso apenas para receber o auxílio financeiro, e muitas vezes sem se preocupar com o futuro e sem a ambição de mudar e melhorar de vida. Seria mais vantajoso, para o indivíduo, não considerar apenas o lado material, mas a melhoria de sua qualidade de vida, como mencionado por Stiglitz, Sen e Fitoussi (2010).
Ao atingir os objetivos do trabalho percebeu-se que os indicadores e pesquisas considerados no estudo não atendem integralmente o modelo teórico de desenvolvimento sustentável, dada a complexidade de contemplar todas as variáveis que envolvem o conceito de desenvolvimento. Como afirmam Stiglitz, Sen e Fitoussi (2010), não existe um único indicador que possa mensurar uma sociedade, por causa da sua pluralidade e complexidade.
As variáveis que são mensuradas estão diretamente relacionadas aos conceitos. Quando desenvolvimento era sinônimo de crescimento, o PIB era um indicador suficiente. A partir do momento que o conceito de desenvolvimento ganhou nova dimensão, com a incorporação dos aspectos sociais, ambientais, e a perspectiva temporal inerente à sustentabilidade, novos indicadores passaram a ser demandados. A criação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é reflexo dessa demanda, mas também não atende plenamente ao escopo conceitual do desenvolvimento.
Talvez não se chegue a um indicador único para aferição do desenvolvimento, dada a sua complexidade conceitual, porém gerar informações acerca das variáveis que o compõem é um dever do Estado, uma vez que o cidadão tem assegurado constitucionalmente o direito ao desenvolvimento. A Constituição Federal do Brasil destaca que são fundamentos da República Federativa do Brasil constituir sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais, promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, gênero, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Ainda a Constituição Federal, no artigo 6º, considera direitos sociais a educação, saúde, alimentação, moradia, trabalho, lazer, segurança social, proteção à maternidade e à infância, e assistência aos desamparados (BRASIL, 1988).
Observa-se, a partir das instituições de pesquisa analisadas, que houve avanços que refletem a intencionalidade em gerar informações que abranjam as dimensões do desenvolvimento. Tal fato pode ser observado no censo do IBGE, que na versão 2000 incorporou elementos que não estavam presentes nas medições anteriores com o intuito de acompanhar as mudanças sociais. Há, no entanto, questões políticas e metodológicas a serem superadas.
Entre os aspectos políticos, a fragmentação e a setorização dos dados aparentam ser algo que demanda revisão e que reflete a fragmentação e a setorização da própria estrutura de governo.
Assim, por exemplo, cabe ao Ministério da Educação a tarefa de avaliar a qualidade da educação. A dificuldade está em articular esse indicador com outras informações que são de responsabilidade de outros órgãos governamentais. Essa desarticulação possivelmente é reflexo da própria desarticulação dos setores do governo, tanto horizontal, entre os ministérios, quanto vertical, entre as esferas federal, estadual e municipal. Mesmo as instituições estudadas, IBGE e IPEA, em alguns pontos parecem estar mensurando o mesmo a partir de critérios e métodos diferentes.
A pesquisa analisada da instituição IBGE, o censo Demográfico é a pesquisa com mais riqueza de detalhes em suas questões, possibilitando maior compreensão das características sociodemográficas do país. Já as pesquisas da instituição IPEA, com os sistemas de Indicadores de percepção social abrangem saúde, educação, segurança pública, assistência social, pobreza e tolerância social, e violência contra as mulheres. Em cada pesquisa uma dimensão do bem-estar do indivíduo é avaliada separadamente em razão do objetivo de cada pesquisa, o que pode torná-la mais limitada na possibilidade de articulação desses dados com outras dimensões do desenvolvimento.
Em relação aos aspectos metodológicos, situações como a própria divisão territorial oficial do país gera conflitos conceituais e, consequentemente, dificuldades na comparação e articulação dos dados. A divisão territorial das mesorregiões, definida pelo IBGE, por vezes esbarra nas delimitações territoriais dos estados para fins de geração de dados estatísticos. Enfim, pode-se formular a ideia de que a setorização do governo se reflete na fragmentação dos dados pelas instituições de pesquisa.
Especificamente em relação às informações disponibilizadas pelas instituições IBGE e IPEA, é possível afirmar que a primeira disponibiliza vasto acervo de documentos para consulta no que diz respeito ao estudo realizado. O IBGE disponibiliza, com detalhes, todo o processo de sua pesquisa: a metodologia, os comentários referentes aos resultados encontrados e, em muitos estudos, o próprio questionário aplicado para a coleta de informações.
O IPEA, em sua página na internet, disponibiliza informações pertinentes ao estudo em questão, porém não tantas quanto o IBGE. A Instituição não aborda com riqueza de detalhes todo o procedimento metodológico de pesquisa. Em alguns indicadores analisados neste estudo o processo metodológico foi encontrado com clareza, em outros não. A relação do IPEA com o Ministério do Desenvolvimento o torna mais próximo do governo, diferentemente do IBGE, que se posiciona de maneira mais contundente como um órgão de Estado.
Mensurar desenvolvimento, na concepção contemporânea do termo, é uma tarefa complexa e que demanda articulação política e escolhas metodológicas para diagnosticar assertivamente a realidade de uma região ou local do país. A devida formulação de políticas públicas deve ser realizada para que os cidadãos brasileiros possam de fato ter seu direito à qualidade de vida garantido, pois assim dispõe a Constituição Federal do Brasil.
A partir deste estudo outros poderão ser feitos, com outras abordagens e objetivos, o que é extremamente importante para que se torne possível um melhor entendimento das características sociodemográficas do Brasil para a formulação de políticas públicas.
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1. Mestre em Planejamento e Desenvolvimento Regional - Universidade de Taubaté - SP, Brasil deysene@hotmail.com
2. Doutora em Comunicação e Semiótica - PUC e docente do Mestadoe em Planejamento e Desenvolvimento Regional - Universidade de Taubaté - SP, Brasil monicafcarniello@gmail.com